“Trump, Desafiar o Status Quo” é como se intitula o livro que o leiriense Carlos Martins acaba de editar. Aos 26 anos e com formação na área do Direito e da Gestão, este analista de investimentos, que já desempenhou funções na J.P. Morgan em Londres, debruça-se sobre uma personalidade polémica que quer ser Presidente dos Estados Unidos da América.

Por que motivo resolveu escrever um livro sobre Donald Trump?

Reconheci que seria uma oportunidade para contextualizar objetivamente um fenómeno singular, que nos convida a debater temas habitualmente considerados demasiado polémicos para serem debatidos no âmbito das eleições. Ora, a democracia e a pluralidade de opiniões são aspetos muito positivos que nos permitem ouvir várias posições sobre temas distintos. Trump é uma óptima oportunidade para debatermos estas temáticas. Os populismos têm crescido e continuarão a crescer por toda a Europa. Donald Trump é a manifestação americana dessas tendências ideológicas. Mesmo que no fim discordemos daquilo que propõe, antes de tudo teremos que perceber quais são as medidas que sugere e o porquê, isto é, qual a base factual e lógica que o motiva. Em Janeiro o Parlamento Britânico debateu durante 3 horas a possibilidade de banir Trump de entrar no seu território (apesar de não ter competências para tal) em razão da proposta do candidato, de construir uma muralha. Volvidos 8 meses, o Reino Unido está a construir um muro em Calais utilizando os mesmos argumentos. Teriam sido poupados a este embaraço se tivessem, desde logo, analisado de forma racional e concreta as razões de fundo. 


Como e durante quanto tempo fez a sua pesquisa?

O livro é o resultado de um ano de pesquisa e escrita, recolhendo cerca de 500 fontes, desde artigos jornalísticos, a estatísticas e documentos oficiais do Governo Americano e das suas agências (Departamento de Justiça, FBI, CIA, etc).


O que pode revelar sobre a obra, para ‘aguçar’ o interesse dos leitores?

Muitos leitores ficarão surpreendidos em saber que o grande movimento de apoio de Trump é constituído por trabalhadores de fábricas, de colarinho-azul e pelos empresários de pequenas e médias empresas. Curiosamente, Hillary Clinton, candidata de “esquerda”, é financiada por Fundos Especulativos de Wall Street, num valor 2500 vezes superior ao de Trump, que não recebeu o apoio de nenhum dos presidentes das 100 maiores multinacionais americanas. Tal é explicado por Trump se focar na recuperação de postos de trabalho da classe trabalhadora americana, que foram sendo deslocalizados para o México e para a China. Estes trabalhadores viram o desemprego e a precariedade crescer, à medida que, de 2001 a 2011, fecharam 70.000 fábricas nos EUA – portanto, a uma média de 15 por dia. Na perspetiva económica, o candidato mais à “esquerda” é o Donald Trump.
Trump é também o candidato mais pacífico no que toca à política externa americana. O seu estilo mais frontal é, por vezes, confundido com belicismo. Nestas semanas temos assistido a uma preocupante deterioração das relações entre a Rússia e os EUA. O candidato republicano é o primeiro potencial presidente desde 1945 a propor relações amistosas, colaborantes e em paridade com a Rússia. Em sentido contrário, Hillary Clinton tem adotado um discurso beligerante para com Putin e a presença Russa em território sírio (sendo que esta é legítima ao abrigo do Direito Internacional, o mesmo não se podendo dizer da presença americana, por ausência de um convite formal do governo de Assad). Estes são apenas dois exemplos, entre muitos outros, apresentados no livro, que irão surpreender as ideias pré-concebidas dos nossos cidadãos.


Se fosse cidadão norte americano, votaria em Trump? Porquê?

A pergunta está muito bem formulada, pois só nas vestes de um cidadão americano podemos avaliar adequadamente a qualidade ou o demérito de Trump enquanto potencial presidente dos EUA. E o livro irá permitir que o leitor consiga fazer esse juízo. São filtrados mais de 500 artigos de jornais, fontes oficiais do Governo Americano e do FBI para proporcionar uma visão estruturada, simples e esclarecedora a todos os interessados. Sendo um cidadão português, europeu e produto da Civilização Ocidental, fico satisfeito por ver um candidato presidencial que seja contra o intervencionismo externo. Em particular, olhando para a forma como as relações entre os EUA e a Rússia se estão a deteriorar, a sugestão de Trump, em estabelecer uma aliança entre Rússia e os EUA, para erradicar o Estado Islâmico, parece-me muito mais apelativa para evitar este conflito – que seria devastador não só para ambos, como para a Europa, que poderia ser convertida no Campo de Batalha devido à sua posição geo-política.


O que mais/menos aprecia no candidato Donald Trump?

Se me permite, comecemos pelos pontos menos apreciáveis. Trump, pelo seu estilo frontal e “desacorrentado”, é responsável por boa parte das críticas, essencialmente de estilo, que lhe são feitas. Estando ao leme de uma campanha que desafia todos os dogmas sagrados do regime americano, poderia optar por um discurso treinado, que evitasse caricaturas e frases fora do contexto. Mas alguns destes traços que nós, portugueses, tendemos a rejeitar, são precisamente as características que uma parte considerável do eleitorado americano tende a considerar como virtudes. Onde os portugueses veem arrogância, os americanos veem a confiança necessária para governar uma superpotência. Onde nós identificamos uma imagem pouco polida, os seguidores de Trump reconhecem um discurso franco, não poluído pelos tiques e pela narrativa artificial dos políticos de Washington.
O valor da campanha de Trump vai muito para além do resultado das eleições no dia 8 de novembro. Ele forçou o debate em temas que não podiam ser votados pelo eleitorado, pois ambos os partidos se recusavam a fazê-lo. É o caso do controlo da imigração, legal e ilegal; da adopção de medidas protecionistas para os postos de trabalho americanos; da crítica da política-externa, a que eu apelidei de Desnorte-americana, no que toca às relações com a Rússia e, sobretudo, às operações desastrosas operadas na região do Médio-Oriente.
O que podemos apreciar em Donald Trump – concorde-se ou não com as medidas que propõe, ou com o estilo em que as exprime – é o facto de ser um candidato bilionário, de quase 70 anos, que procura enfrentar um sistema hostil a todos aqueles que pensam fora do padrão. Ele convidou ao debate, e tendo sido o candidato da história do partido republicano com o maior número de votos, os tópicos debatidos não poderão mais ser sonegados. Será útil contextualizá-los, pois eles irão regressar às luzes mediáticas pela pressão eleitoral.